Saber economizar, saber consumir… sobre a construção de uma história da matemática financeira na escola

03/10/2018 11:00

Por Jéssica Ignácio de Souza

Questionar o que me dizem do fixo, escreve Joseane Arruda. Ao ler, logo me deparo encontrando as palavras que faltavam pra expressar o que me fez pensar um tema de tese. Palavras emprestadas, roubadas, diz Thaline Kuhn. E, me parece, neste emprestar de palavras, nestes encontros e composições, se constitui o GECEM… e se constroem pesquisas, e se formam pesquisadores e professores que buscam não o representar o mundo, mas o apresentar o mundo!1

Pois bem, um fixo me deslocou o pensar: a matemática financeira deve estar presente no currículo da matemática da educação básica, e na perspectiva de uma educação financeira.

De um PCN com indicação de conteúdos da matemática financeira, para uma BNCC que enfatiza a educação financeira nestes conteúdos.

Entre pensares, alguns questionamentos inquietam… Quais as condições de possibilidade que forjaram um discurso a propósito da educação financeira na escola? Quais práticas discursivas se encontram inseridas nessa conduta de defesa da educação financeira na matemática escolar constituintes da história desse saber?

Inquietam e movimentam o pesquisar, dando início a um projeto de tese que se apoia em ferramentas teórico-metodológicas a partir dos estudos de Michel Foucault.

Algumas práticas discursivas se inscrevem nas pesquisas acadêmicas sobre o tema2, e também nos livros didáticos…

Saber trocar.

Saber para um trabalho comerciário.

Saber economizar.

Saber consumir…

Sobre o século XIX, Foucault mostra que a criação de caixas econômicas e de assistência teve em vista a necessidade de controlar as economias do operário, de modo que este pudesse sobreviver durante as épocas de desemprego. Dessa maneira, “o tempo do operário, não apenas o tempo do seu dia de trabalho, mas o de sua vida inteira, poderá efetivamente ser utilizado da melhor forma pelo aparelho de produção”3.  Sobre o século XX, Veiga-Neta afirma que o currículo escolar é construído de modo que “amplie os contingentes dos ‘bons consumidores’ e ‘bons competidores’, forme indivíduos sintonizados com a governamentabilidade neoliberal e a ela assujeitados, dê respostas às demandas impostas pelas novas formas hoje assumidas pelo capitalismo”4.

Essas falas, sobre a necessidade de controle da economia dos indivíduos bem como de moldar certo tipo de consumidor, nos dão pistas sobre uma história de um saber financeiro que adentra a escola.

A movimentação deste fixo está possibilitando a construção de um projeto de tese que objetiva analisar um conjunto de práticas sócio-culturais que possibilitaram a emergência da educação financeira no currículo da matemática escolar.

E com as pensagens neste projeto, como diz Cássia Schuck, sigo a indicação de Jussara Brigo: arriscando, perdendo-me, experimentando…

Referências
1SIMONS, Maarten; MASSCHELEIN, Jan. Un-contemporany mastery: the ordinary teacher as pholosopher. In: ZAHN, Manuel; PAZZINI, Karl-josef. Lehr performances: filmische inszenierungen des lehrens. Alemanha: Vs Verlag, 2011. p. 17-35.
2SOUZA, Jéssica Ignácio de; FLORES, Cláudia Regina. Educación matemática financiera en la escuela: a propósito de prácticas discursivas para la historia de un saber. Revista Paradigma, Venezuela, v. 34, n. 1, p. 249–264, 2018.
3FOUCAULT, Michel.  A verdade e as formas jurídicas. 3. ed. Rio de janeiro: NAU, 2009, p. 118.
4VEIGA-NETO, Alfredo. Currículo: um desvio à direita ou delírios avaliatórios. Texto apresentado no X Colóquio sobre questões curriculares e VI colóquio Luso-brasileiro de Currículo. Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG: Belo Horizonte, 2012, p. 6.