Do encontro de palavras se tece uma tese
Thaline Thiesen Kuhn
thali.thiesen@gmail.com
[…] é certo que as palavras são assim mesmo, vão e voltam, e vão, e voltam, e voltam, e vão, mas porquê estavam estas aqui à minha espera, porquê saíram comigo de casa e não me largaram em todo o caminho, não amanhã, não depois de amanhã, mas hoje, agora mesmo. […] palavras que à primeira vista parecem não passar de um adorno de frase em todos os sentidos dispensável, acabam por meter medo quando nos pomos a pensar nelas e compreendemos aonde querem chegar […]
José Saramago
Inicio essa escrita com as palavras de José Saramago para colocar em linhas o que aflige uma doutoranda; o encontro ou des-encontro com palavras. Desse modo, portanto, esta escrita traduz-se como uma tentativa inicial de dar vida a uma tese. Uma tentativa de materializar um pensamento. De captar fragmentos.
Uma escrita que se tece com gestos de mundo, os quais chamam minha atenção. Uma escrita feita em intervalos de sons, de pensamentos meus e de outrem, de palavras dadas, emprestadas, roubadas, rabiscadas, exploradas, trocadas, compartilhadas. Sinto-me que ao escrever uma tese, estou a desvendar e descobrir novos caminhos, e é esse meu modo de escrita: emaranhar-me em meio às palavras, minhas e de outros em “movimento incertos, movediços, provocativos”.
As palavras vêm, vão e voltam. Elas atravessam todos os momentos da minha vida, martelam minha cabeça, saltitam em meus pensamentos, passam dia e noite comigo. Há algum tempo observo as palavras, por vezes, anoto-as no anseio de capturá-las, com medo de não encontrá-las, mas elas sempre me escapam. E, quando me pego a pensar onde quero chegar com essa escrita, elas, as palavras, me assustam ainda mais.
Eu simplesmente fecho os olhos e, me permito atravessar e ser atravessada pelas palavras que, por outrora, percorrem meus ouvidos e o espaço o qual estou inserida.
Tantas palavras borbulham dentro de mim. As palavras querem pular para fora de mim. Querem vir à tona. Querem ser conhecidas, lidas. Contudo, eis que estou diante delas, e não sei o que fazer. Elas acabam escorregando, tropeçando e me deixando revelá-las.
Desenho.
História.
Dispositivo.
Técnico.
Industrial.
Discurso.
Enunciado.
Franklin Cascaes.
O fato é que estou encantada com estas palavras. E, é com estas palavras que venho dialogando. Mais do que palavras soltas, elas vão se encontrando e compondo uma tese. Uma tese que problematizará o enunciado que torna a disciplina de Desenho tanto agente, quanto suporte, para uma educação técnico-industrial brasileira, a saber: a disciplina de Desenho é essencial para o desenvolvimento econômico, para a civilidade e o progresso, bem como um saber voltado para preparar os indivíduos para o trabalho. Em outras palavras, quero entender como tal enunciado se entrelaça com outros que compuseram o discurso pedagógico brasileiro em meados do século XX.
No interesse de examinar os enunciados sobre a disciplina de desenho nas escolas industrias do estado de Santa Catarina, escolho para a tese, de modo particular, os materiais pessoais de Franklin Cascaes, professor de desenho por quase três décadas na Escola Industrial de Florianópolis (1941-1970).
Por fim, esta escrita foi produzida entre desejos, dificuldades e expectativas. Foi pensada, elaborada e reorganizada diversas vezes, tentando buscar uma maneira de apresentar ao leitor a ideia de uma Tese que se propõe pensar a disciplina de desenho em meio a um dispositivo técnico-industrial.